Como entender e ajudar a geração Z e os jovens “nem-nem” no Brasil

  • 21/09/2023

Entrevista realizada pela jornalista Lilia Barros com o pastor Elton Melo, para a Revista Comunhão, a revista de maior circulação para o público evangélico do Brasil.

Últimas Gerações

Desde o final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), diversas gerações têm surgido, cada uma moldada por eventos e tendências sociais únicas. Vamos percorrer essas gerações até a atual Geração Z:

  1. Baby Boomers (1946-1964): Os Baby Boomers nasceram no rescaldo da guerra e cresceram em uma época de prosperidade econômica nos Estados Unidos e em muitas partes do mundo. Eles valorizavam a estabilidade, o trabalho árduo e a família. Os Boomers desempenharam um papel importante nos movimentos pelos direitos civis e pela igualdade de gênero nas décadas de 1960 e 1970. Eles viram avanços tecnológicos, como a chegada da televisão.
  2. Geração X (1965-1980): A Geração X testemunhou a crescente influência da tecnologia, como o surgimento dos computadores pessoais e dos videogames. São conhecidos por sua independência e ceticismo em relação às instituições. Muitos enfrentaram desafios econômicos, como a recessão da década de 1980. Eles valorizam o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal.
  3. Geração Y (Millennials, 1981-1996): Os Millennials cresceram com a internet, transformando a forma como as informações são acessadas e compartilhadas. São conhecidos por sua adaptabilidade, valores progressistas e preocupação com questões sociais e ambientais. Eles experimentaram eventos significativos, como o 11 de setembro e a Grande Recessão. Muitos buscam trabalhos com propósito e equilíbrio entre vida pessoal e profissional.
  4. Geração Z (1997-presente): A Geração Z é a primeira a crescer totalmente imersa na era digital. São nativos digitais, caracterizados pela fluência tecnológica, uso intensivo das redes sociais e conexão global instantânea. Valorizam a diversidade, a inclusão e o ativismo. Estão enfrentando desafios únicos, como a crescente automação de empregos e a mudança nas dinâmicas de trabalho e educação devido à pandemia COVID-19.

A Geração Z está moldando a cultura atual com seu ativismo, conscientização ambiental e demanda por mudanças sociais.

Eles enfrentam incertezas econômicas, mas também têm acesso a oportunidades globais devido à tecnologia. Seu impacto na sociedade continuará a ser uma narrativa importante nas décadas futuras, à medida que buscam equilibrar a busca pela autenticidade e o ativismo com as pressões econômicas e sociais de um mundo em constante evolução. Como todas as gerações, eles trazem perspectivas únicas, moldadas pelas circunstâncias de seu tempo, que influenciarão a sociedade e a cultura nas próximas décadas.

Jovens “nem-nem”, como entender isso?

1- Como interpretar estes dados?
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O Brasil é classificado como vice-campeão no ranking da OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – de jovens ‘nem-nem’, ou seja, jovens que nem estudam, nem trabalham. Isso é uma preocupação séria e merece atenção. Essa situação reflete uma parcela significativa da juventude brasileira que enfrenta dificuldades em se inserir no mercado de trabalho ou acessar a educação formal. É importante observar que esses números podem variar ao longo do tempo e de acordo com a metodologia de coleta de dados da pesquisa.

2- Parece que essa geração é muito crítica, tem opinião e resposta para tudo, porém sem compromisso, sem responsabilidades. Não se preocupa em se formar e profissionalizar. Isso procede?

A percepção de que a Geração Z é crítica, tem opiniões, mas parece não se comprometer com responsabilidades como formação profissional pode ser um estereótipo que não se aplica a todos os jovens dessa geração. No entanto, é verdade que a juventude contemporânea enfrenta desafios diferentes dos das gerações anteriores, como uma economia mais volátil e a crescente importância das tecnologias digitais, o que pode afetar suas escolhas educacionais e profissionais.

A alta incidência de jovens da Geração Z que não estudam e não trabalham pode ser atribuída a uma série de fatores complexos e interligados:

  1. Desafios econômicos: A Geração Z enfrenta desafios econômicos significativos, incluindo altas taxas de desemprego e subemprego, salários estagnados e custos crescentes de vida, como habitação e educação superior. Isso pode desencorajar os jovens de buscar educação e emprego.
  2. Acesso à educação: Nem todos os jovens têm acesso igualitário à educação de qualidade. A falta de acesso a escolas de qualidade, recursos educacionais e oportunidades de bolsas de estudo pode limitar as perspectivas educacionais.
  3. Mudanças tecnológicas: A automação e a mudança tecnológica rápida estão transformando o mercado de trabalho. Alguns jovens podem se sentir despreparados para enfrentar essa evolução e podem adiar a entrada no mercado de trabalho.
  4. Pressões sociais e mentais: A Geração Z também enfrenta pressões sociais significativas, como o estresse relacionado às redes sociais, preocupações com a imagem corporal e saúde mental. Isso pode afetar negativamente sua capacidade de se concentrar nos estudos ou no trabalho.
  5. Desalento: O desalento é um fenômeno em que os jovens desistem de procurar emprego devido à falta de oportunidades ou à falta de confiança em suas habilidades. Isso pode levar ao status ‘nem-nem’.
  6. Escolhas educacionais: Alguns jovens podem escolher adiar a educação superior ou entrar no mercado de trabalho diretamente após o ensino médio, levando a uma pausa temporária nos estudos.
  7. Cultural e social: Mudanças culturais e sociais, como uma ênfase na busca de propósito e satisfação pessoal em vez de empregos tradicionais, podem levar alguns jovens a adiar a entrada na força de trabalho ou a buscar alternativas menos convencionais.
  8. Incertezas políticas e econômicas: Incertezas políticas e econômicas, como crises financeiras ou instabilidade política, podem afetar negativamente a confiança dos jovens na perspectiva de um futuro estável.

É importante reconhecer que as causas podem variar entre diferentes regiões e grupos socioeconômicos. Abordar esse problema requer uma abordagem multifacetada que inclui políticas educacionais, programas de empregabilidade, apoio à saúde mental e esforços para reduzir as desigualdades econômicas.

Compreender as causas é o primeiro passo para criar soluções eficazes para apoiar a Geração Z em sua transição para a vida adulta.

3- De quem é a responsabilidade? Da família, do estado, da igreja ou dos próprios jovens? Por quê?

A responsabilidade pela situação dos jovens ‘nem-nem’ é compartilhada. A família, o Estado, a igreja e os próprios jovens têm papéis a desempenhar. A família desempenha um papel crucial na educação e orientação dos jovens. O Estado deve garantir o acesso à educação de qualidade e políticas de emprego adequadas. A igreja e outras instituições sociais podem oferecer apoio moral e comunitário. Os próprios jovens também devem tomar decisões responsáveis em relação à sua educação e carreira.

4) Quais os riscos dessa situação?

Os riscos dessa situação incluem a perpetuação do ciclo de pobreza, falta de qualificação profissional, menor participação na economia e até problemas sociais, como a criminalidade. Além disso, pode haver um impacto negativo na saúde mental e bem-estar dos jovens que se sentem excluídos do sistema educacional e econômico. Podemos detalhar melhor estes conceitos.

Os riscos associados à alta incidência de jovens ‘nem-nem’ são significativos e abrangentes:

  1. Perpetuação do ciclo de pobreza: Jovens que não estudam nem trabalham enfrentam uma probabilidade maior de permanecer em situações de pobreza ao longo de suas vidas. Isso pode criar um ciclo intergeracional de desvantagem econômica.
  2. Falta de qualificação profissional: Ao não buscar educação ou treinamento profissional, esses jovens podem encontrar dificuldades em adquirir as habilidades necessárias para empregos bem remunerados e estáveis no futuro.
  3. Menor participação na economia: A falta de participação ativa na força de trabalho significa que esses jovens não contribuem significativamente para a economia, o que pode afetar o crescimento econômico de longo prazo do país.
  4. Problemas sociais: Os jovens que se sentem desvinculados da sociedade e sem perspectivas podem enfrentar problemas sociais, como o envolvimento em atividades criminosas, uso de substâncias e outras formas de comportamento de risco.
  5. Impacto na saúde mental: A falta de propósito, a exclusão social e a falta de perspectiva podem ter um impacto negativo na saúde mental dos jovens, levando a problemas como ansiedade, depressão e isolamento social.
  6. Desigualdade e exclusão social: A alta incidência de jovens ‘nem-nem’ pode aprofundar as desigualdades sociais e econômicas em uma sociedade, pois esses jovens podem ser excluídos de oportunidades que outros desfrutam.
  7. Custo para o sistema de bem-estar social: Jovens que não estão ativamente envolvidos em educação ou emprego podem depender de programas de assistência social, aumentando o custo para o sistema de bem-estar social e os contribuintes.
  8. Perda de potencial: Cada jovem que não está realizando seu potencial educacional e profissional representa uma perda de talento e recursos para a sociedade como um todo.

Portanto, a alta incidência de jovens ‘nem-nem’ representa uma preocupação significativa, não apenas para os próprios jovens, mas também para a sociedade em geral. É fundamental abordar esses riscos por meio de políticas públicas, apoio familiar, orientação educacional e oportunidades de emprego para garantir um futuro mais promissor para essa geração

Como mudar esta realidade

5) O que a Igreja e a família podem e devem fazer para mudar esse quadro?

A situação dos jovens ‘nem-nem’ no Brasil, como destacada pela OCDE, é um desafio complexo. Do ponto de vista teológico, isso nos lembra da importância de cuidar dos vulneráveis e desfavorecidos na sociedade, como ordenado por muitos ensinamentos bíblicos, incluindo o mandamento de amar o próximo como a si mesmo.

Tanto a igreja quanto a família podem desempenhar um papel importante na mudança desse quadro. A igreja pode fornecer orientação moral e apoio emocional aos jovens. A família pode incentivar e apoiar a educação de seus membros, além de fornecer um ambiente estável e favorável ao desenvolvimento pessoal.

Para mudar o quadro da alta incidência de jovens ‘nem-nem’, a igreja e a família podem desempenhar papéis significativos:

  1. Orientação moral e espiritual: A igreja pode oferecer orientação moral e espiritual, ensinando princípios de responsabilidade pessoal, ética e solidariedade. Isso pode ajudar os jovens a desenvolver uma base sólida para tomar decisões informadas sobre educação e carreira.
  2. Apoio emocional e comunitário: A igreja pode fornecer um espaço de apoio emocional e comunidade para jovens que enfrentam desafios. Isso pode incluir grupos de jovens, aconselhamento pastoral e programas de apoio à saúde mental.
  3. Incentivo à educação: Tanto a igreja quanto a família podem enfatizar a importância da educação como um meio de capacitação e crescimento pessoal. Isso pode incluir encorajar a participação em programas educacionais, fornecer recursos para bolsas de estudo e oferecer apoio na busca de oportunidades educacionais.
  4. Modelagem de valores: A família desempenha um papel fundamental na modelagem de valores, incluindo responsabilidade, perseverança e resiliência. Os pais podem inspirar seus filhos a buscar o autoaperfeiçoamento e a independência.
  5. Diálogo aberto: Tanto a família quanto a igreja podem promover o diálogo aberto com os jovens, permitindo que expressem suas preocupações, aspirações e desafios. Isso ajuda a entender suas necessidades e a oferecer apoio adequado.
  6. Mentoria e aconselhamento: Programas de mentoria dentro da igreja ou da comunidade podem conectar jovens com adultos mais experientes que podem orientá-los em suas escolhas educacionais e de carreira.
  7. Programas de capacitação profissional: A igreja e a família podem colaborar com programas de capacitação profissional ou iniciativas de empregabilidade para ajudar os jovens a adquirir habilidades práticas e acesso ao mercado de trabalho.
  8. Promoção do voluntariado e do serviço comunitário: Incentivar os jovens a se envolverem em atividades de voluntariado e serviço comunitário pode não apenas desenvolver suas habilidades, mas também cultivar um senso de responsabilidade e propósito.
  9. Promoção da resiliência: Tanto a igreja quanto a família podem enfatizar a importância da resiliência e da superação de desafios. Isso ajuda os jovens a enfrentar dificuldades e a manter o foco em seus objetivos.

Em conjunto, essas abordagens da igreja e da família podem criar um ambiente de apoio e orientação que capacita os jovens a tomar decisões informadas, buscar educação e oportunidades de emprego e, assim, mudar o quadro dos ‘nem-nem’ para um futuro mais promissor.

6) É possível fazer um comparativo da postura da juventude nas últimas décadas?

Comparativamente, a postura da juventude nas últimas décadas tem evoluído de acordo com as mudanças sociais, econômicas e tecnológicas. Cada geração enfrenta desafios e oportunidades únicos. A Geração Z é influenciada pela tecnologia digital e pela globalização, o que molda suas perspectivas e escolhas. (Veja o tópico da introdução).

7) Para onde caminha essa juventude?

O caminho que essa juventude está seguindo pode variar amplamente. Alguns jovens podem superar os desafios e prosperar, enquanto outros podem continuar a enfrentar dificuldades. Muitos fatores, incluindo políticas governamentais, oportunidades econômicas e acesso à educação, desempenharão um papel importante em seu futuro.

A direção que a juventude ‘nem-nem’ da Geração Z está tomando é influenciada por uma série de fatores, e é importante reconhecer que essa direção pode ser altamente variável de um indivíduo para outro. Aqui estão algumas das possíveis trajetórias:

  1. Superando desafios: Alguns jovens ‘nem-nem’ podem encontrar maneiras de superar seus desafios, seja por meio de programas de capacitação, acesso a oportunidades de emprego, ou iniciativas educacionais que lhes permitem adquirir habilidades e se integrar na sociedade de maneira mais plena.
  2. Persistência na situação atual: Alguns jovens podem permanecer em uma situação de não estudo e não trabalho por um período prolongado devido a obstáculos significativos ou falta de oportunidades. Isso pode levar à perpetuação de seu status ‘nem-nem’.
  3. Mudança de foco: Alguns jovens podem optar por se concentrar em outras áreas de suas vidas, como o voluntariado, o ativismo social ou a busca de projetos pessoais. Embora não estejam envolvidos em estudos ou trabalho tradicionais, podem encontrar significado em outras atividades.
  4. Transições tardias: Alguns jovens podem atrasar sua entrada na educação superior ou no mercado de trabalho por razões pessoais, como viagens, descoberta de interesses pessoais ou cuidados familiares. Eles podem eventualmente fazer a transição para a educação e o emprego quando se sentirem mais preparados.
  5. Necessidade de apoio e intervenção: Para alguns jovens ‘nem-nem’, pode ser necessária intervenção de serviços sociais, educação especializada, aconselhamento ou reabilitação para ajudá-los a superar barreiras e encontrar um caminho mais positivo.
  6. Desafios persistentes: Infelizmente, alguns jovens podem continuar enfrentando dificuldades significativas, incluindo desemprego crônico, falta de acesso à educação e problemas de saúde mental. Nesses casos, é fundamental que a sociedade forneça apoio e oportunidades para ajudar esses jovens a melhorar sua situação.

O caminho que cada jovem da Geração Z, em particular o “nem-nem” escolhe ou é forçado a seguir depende de uma variedade de circunstâncias individuais e sociais. Portanto, é crucial que governos, organizações, famílias e comunidades trabalhem juntos para criar um ambiente favorável que ofereça oportunidades educacionais, de emprego e de desenvolvimento pessoal, ajudando assim a maioria desses jovens a encontrar um caminho mais promissor em direção ao seu futuro.

8) Biblicamente o jovem tem a obrigação de estudar e trabalhar?

A Bíblia ensina princípios como responsabilidade pessoal, diligência e busca de sabedoria. Portanto, os jovens devem buscar a educação e o trabalho como parte de seu desenvolvimento pessoal e contribuição para a sociedade. O livro de Provérbios, por exemplo, enfatiza a importância da sabedoria e do entendimento como fonte de bênçãos e sucesso na vida. Provérbios 4.7 afirma: “O conselho da sabedoria é: procure obter sabedoria; use tudo que você possui para adquirir entendimento” (NVI).

Além disso, a Bíblia ensina sobre a responsabilidade no trabalho. Em 2Tessalonicenses 3.10, está escrito:  “Quando ainda estávamos com vocês, nós lhes ordenamos isto: se alguém não quiser trabalhar, também não coma. Isso ressalta a importância do esforço e da contribuição para a própria subsistência. A Bíblia promove valores como a busca de sabedoria e a diligência no trabalho como meios de honrar a Deus e viver uma vida plena e responsável.

Conclusão

Concluindo, este estudo sobre a alta incidência de jovens ‘nem-nem’ da Geração Z nos leva a refletir sobre a complexidade dos desafios enfrentados por essa coorte demográfica. É evidente que não existe uma única resposta para essa situação, uma vez que ela é influenciada por uma variedade de fatores econômicos, sociais e individuais.

É imperativo que a sociedade, os governos, as instituições educacionais, as famílias e as comunidades se unam para abordar essa questão de forma abrangente. Isso envolve a criação de políticas públicas que incentivem a educação e o acesso ao mercado de trabalho, a promoção de oportunidades de capacitação profissional e a construção de redes de apoio emocional e social para os jovens.

Também é essencial reconhecer a diversidade dentro da Geração Z e compreender que cada jovem enfrenta circunstâncias únicas. Portanto, abordagens personalizadas são cruciais para fornecer o suporte necessário a cada indivíduo.

Além disso, à medida que a Geração Z avança em direção à vida adulta, é fundamental criar espaços para que esses jovens se envolvam na tomada de decisões que afetam seu futuro. Seu ativismo, preocupações sociais e criatividade podem ser canais poderosos para a mudança positiva na sociedade.

Em última análise, nosso compromisso com o bem-estar e o futuro da Geração Z é um reflexo de nosso compromisso com o progresso social e econômico. Ao investir em oportunidades educacionais, empregabilidade e apoio emocional, podemos ajudar a moldar um futuro mais promissor para esses jovens e, assim, fortalecer nossa sociedade como um todo.


elton-posse-rostoElton Melo é pastor titular da Primeira Igreja Batista Independente de Curitiba. Produz vários estudos teológicos e motivacionais, que estão disponíveis no site www.alcancevitoria.com. Tem vários livros escritos e também é presidente da ASEC – Associação de Editores Cristãos.

 

Lilia de Souza Barros, é jornalista e locutora. É cristã e reside em Vila Velha, ES – Contatos:  liliabarros7@gmail.comLinkdin.

Autor: Elton Melo